domingo, 14 de novembro de 2010

Definição de amor de John Piper

"O amor é o transbordar da alegria em Deus que alcança as pessoas e as atrai para dentro dessa alegria, e está disposto a morrer no processo."

Pr John Piper

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Prisma Brasil - Asas da Alva

O pão partido e distribuído

Sobre o corpo de Cristo.
Esboço de pregação do dia 05 de setembro de 2010.

“O Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse: Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim” (I Co 11,23-24).

Ampliação de um conceito: o mistério de Cristo e a Igreja. Oculto por séculos, mas agora revelado.
Jesus, homem do seu tempo trabalhando com a cultura de sua época.
Tradição hebraica ortodoxa: o chefe da família parte o pão e o entrega aos membros de sua família, de sua descendência, sua carne e sangue. Amigo não o recebe.
O pão partido e entregue aos seus discípulos significava que os mesmos faziam parte de seu corpo: somos da mesma família.
João 14,14-15: “Já não vos chamo servos, vocês são meus amigos”. Foi mais longe na última ceia: já não vos chamo servos ou amigos, mas de irmãos, carne da minha carne.
Declaração: somos filhos de Deus e membros de seu corpo.
Não somos canibais comendo carne humana; não somos alquimistas tentando transformar um objeto em outro. Cremos que o pão da ceia é o pão da sua presença, ao comê-lo Cristo se comunica a nós.
1.       Encarnação
Quem poderia imaginar que Deus ia entrar na história humana tornando-se igual ao ser humano? Gente?
Sua encarnação não tinha apenas o aspecto exterior. Não era apenas para tornar-se um modelo, mas uma realidade dentro de nós.
Progressão desta revelação:
“Em verdade em verdade vos digo: quem crê tem a vida eterna. Eu sou o pão da vida. Vossos pais comeram o maná no deserto e morreram. Este é o pão que desce do céu, para que todo o que dele comer não pereça. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém dele comer, viverá eternamente; e o pão que darei pela vida do mundo é a minha carne.” Jo 6,47-51
O seu corpo fazia parte de seu projeto de salvação. Absorvemos esta realidade de forma interiorizada.
2.       A Igreja
Na continuação do mistério da fé: a relação de seus seguidores com seu corpo.
Após sua morte seus discípulos reivindicaram seu corpo. José de Arimatéia, rico e influente, o coloca em um túmulo. Os discípulos preparam-se para embalsamá-lo. Parecia tudo terminado.
Mas Deus o ressuscitou dentre os mortos. Seu corpo ganha uma nova dimensão. “Corpo, dado por vocês”. Tem plano e propósito em tudo.
O grande mistério: o corpo de Cristo é estendido aos seus discípulos. A Igreja é a continuadora de sua obra. O Deus encarnado em Jesus se encarna hoje na sociedade através de seus discípulos.
Para o oriental o corpo é a totalidade do ser, incluindo seu caráter e suas atitudes. A Igreja torna Deus conhecido e visível.
Corpo de Cristo composto por órgãos naturais torna-se o corpo de Cristo formado por gente, somos os órgãos ou membros de seu corpo.
Paulo não utiliza esta descrição apenas como uma metáfora para falar da unidade da Igreja. Existe uma realidade mais profunda, o corpo de Cristo entre nós torna-se o corpo de Cristo em e através de nós.
3.       O pão partido
Todos os trechos bíblicos que descrevem o “isto é o meu corpo” afirmam que o pão foi partido.
Aponta para o fato de que seu corpo seria quebrantado, moído, partido: “Ele foi moído pelas nossas iniqüidades” Is 53,5
Sinaliza também o fato do compartilhar, de absorver de forma comunitária de sua essência, interiorizamos sua vida em conjunto. O pão foi partido por nós e para nós.
“Nós, embora muitos, somos unicamente um pão, um só corpo; porque todos participamos de um único pão.” (I Co 10,17).
Conclusão
João, no início do Apocalipse tem uma visão do céu. Ouve seu nome, vira-se para ver quem falava com ele e vê 07 candeeiros de ouro, que representavam a totalidade da Igreja. Depois que ele percebe no meio destes candeeiros a Jesus glorificado.
A Igreja do Senhor Jesus é o seu corpo, o torna visível e presente na história. Pela Igreja, através de gente, de pessoas, o coração de Deus é revelado. Aí ao contemplar esta vitrine de Deus, os nossos corações podem conhecê-lo pessoalmente, além de toda estrutura humana ou eclesiástica.
Escatológico: ei-lo lá...ali...não acrediteis, ele está compartilhado e vive entre os seus. Ele está aqui entre nós, a busca cessou. Ele está aqui, o ausente presente.

Luciano Oliveira

domingo, 15 de agosto de 2010

C. H Spurgeon

"O homem convertido não é um mero convencido que se arrependeu e creu, mas um contínuo confiante que vive arrependido pela graça que o alcançou."

terça-feira, 27 de julho de 2010

Sobre a família e a nova lei do divórcio

A nova lei do divórcio
Bispo Josué Adam Lazier

Está sendo noticiado hoje que o Senado Federal aprovou o divórcio direto, ou seja, tão logo o casal decide-se pela separação poderá formalizar o divórcio e não precisará mais aguardar os prazos de 1 ou 2 anos, conforme o caso. Segundo os proponentes da nova lei, 153 mil pessoas que se divorciam por ano no Brasil serão beneficiadas.
Na verdade, o problema não está na lei, ela apenas reflete uma concepção que se enraíza na sociedade e alcança as pessoas. Segundo estatísticas do último censo do IBGE o número de casamentos civis caiu, no entanto, é crescente o número de famílias que se formam sem atos civis ou mesmo sem as cerimônias religiosas. Infelizmente, esta concepção transmite a idéia de relacionamentos descartáveis e sem afetividade. Ou melhor, enquanto houver a expressão apaixonada dos afetos, as pessoas continuam juntas, mas tão logo as dificuldades do relacionamento se efetivem, a expressão apaixonada se dissipa.
Penso, enquanto pastor, bispo e educador, que o casamento e a família são relacionamentos fundamentais para a pessoa. Não quero tratar das questões familiares a partir de manuais e regras, com moralismo, legalismo, pieguismo, ou outros adjetivos. Por isso considero que, mesmo a família e o casamento se constituindo em relacionamento fundamental, haverá dificuldades, crises, conflitos, que estão nos próprios cônjuges ou pessoas da família. Se estas pessoas mudarem para outra família levarão consigo os mesmos problemas.
Eu não compartilho da idéia da “cara metade” ou da incompatibilidade de gênio. Duas pessoas serão sempre diferentes uma da outra, mas serão pessoas inteiras e que convivem com pessoas inteiras. Eu não sou uma metade que encontrou a sua “metade” para formar o todo. Por certo, nesta “sociedade” conjugal entre pessoas diferentes, haverá desencontros, crises, disputas, desentendimentos, pois é impossível que pessoas diferentes que convivam diariamente não experimentem tensões.
Neste sentido, recorro ao que o apóstolo Paulo ensinou aos Coríntios, ou seja, que Deus nos deu o ministério da reconciliação. Existe um caminho e uma opção para as pessoas que estejam em crise em suas vidas familiares: o caminho da reconciliação, que poderá ser difícil, desafiador, mas oportunizará o reencontro e a renovação dos sentimentos e dos afetos. Não estou espiritualizando a reconciliação, mas sim trabalhando com a idéia de que as pessoas têm força para buscar a superação dos seus problemas vivenciais.
No entanto, reconheço que há relacionamentos que se estragam a ponto de não terem mais condições de continuidade. Esta é uma decisão muito difícil de ser tomada e envolve muita emocionalidade. Os sinais da separação e do divórcio acompanham as pessoas por toda a sua vida. Não há ruptura sem dor, sem perda, sem choro, sem machucadura. Considerando isto, a igreja deve trabalhar a questão da família na perspectiva da graça de Deus, pois ela é curadora e renovadora da pessoa em toda a sua integralidade. A ação da graça de Deus é um processo, também doloroso e lento, mas extremamente transformador.
Bem, o tema é a lei do divórcio direto. Lamentavelmente e independentemente do tempo há motivações para o divórcio, tais como infidelidade; desrespeito; menosprezo; violência moral, verbal e, o que é absolutamente inaceitável, violência física. Estas questões acontecem em todas as classes e segmentos sociais, inclusive no âmbito eclesiástico, ou seja, entre pessoas que professam fé e espiritualidade e são tidas como exemplos de vida. Não são poucos os casos desta natureza que envolve pessoas de reconhecida liderança no ambiente eclesiástico.
Portanto, a lei do divórcio é o mal menor. O mal maior está no coração das pessoas, cujo vazio é do tamanho de Deus (segundo o bispo Desmond Tutu).

Fonte: http://www.metodistavilaisabel.org.br/artigosepublicacoes/descricaocolunas.asp?Numero=1872

sábado, 24 de julho de 2010

"A alegria do cheiro de um livro" Oswaldo Siciliano




O presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL), e fundador da rede de livrariasSicilianoOswaldo Siciliano, faz uma análise do mercado do livro no Brasil em entrevista para a Gazeta Mercantil, 30-10-06. Segundo ele, o País, com seus 180 milhões de habitantes, tem um número muito pequeno de leitores — 26 milhões, quando comparado à França, Espanha, Itália, entre outros.
 Como o senhor analisa o mercado editorial hoje?
Com o fim da cobrança, a partir de 21/12/2004, das taxas do PIS/Confins, muitos empresários do livro tiveram a oportunidade de melhorar um pouco a situação financeira de suas empresas no decorrer de 2005. Algumas editoras conseguiram melhorar e ampliar o número de títulos e conseguiram inclusive, introduzir algumas coleções de bolso para vender livros a preço mais acessível. Além disso, as livrarias hoje usam o mesmo sistema de crediário usado para comprar uma televisão — no cartão em até cinco vezes, sem acréscimo.
Aumentou a venda de livros?
O grande problema é o seguinte: o preço de capa do livro está na razão direta de produção em escala. Hoje, no Brasil, as primeiras tiragens continuam de 2 a 3 mil exemplares e isso faz com que o custo fique mais alto. Depois da extinção do PIS/Confins, no primeiro ano, os livros não baixaram de preço. Em 2006, embora os livros não tenham mais aumentado seu preço e alguns até, a partir de junho deste ano, começaram a baixar, o aumento de vendas não ocorreu.
 Qual a explicação para isso?
Na realidade, o preço não é o grande inibidor do mercado, mas sim a falta do hábito da leitura. É na educação que está o problema. A educação tem que se amoldar, dentro dos tempos modernos, aos idos das décadas de 1940 e 1950, quando nas escolas havia aulas de leitura e se lia junto com a professora. É dessa forma que se aprende a gostar de ler, se adquire o hábito. Respeitamos a modernidade, queremos evoluir, mas vamos usar aquilo deu certo no passado. Acabaram com essas aulas e o resultado é esse que vemos: jovens de 15, 20 anos que não sabem nem mesmo o que significa a palavra eficaz.
 O que pode ser feito?
É aí que entra a responsabilidade do governo e agora os ministros da Educação e da Cultura chegaram à conclusão de que temos de trabalhar juntos. Desenvolver o hábito da leitura e assim vender mais livros é um trabalho demorado, de 10, até 20 anos, mas deve ser feito.
 Como a CBL e outras entidades ligadas ao livro estão trabalhando para mudar essa situação?
Recentemente foi criado o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), uma política de estado para garantir a todos o acesso ao livro e à leitura, com a nossa participação. Participamos também do Manifesto do Povo do Livro, que entre suas propostas prevê a revitalização de bibliotecas públicas a partir de 2007. Esse foi e ainda está sendo um grande trabalho. Por ocasião da campanha política, entregamos o manifesto a todos os candidatos. Hoje e amanhã, aqui na sede da CBL, estarão reunidos presidentes de diversas entidades ligadas ao setor para conversar e traçar metas conseguir pelo menos cinco milhões de assinaturas, anexar ao manifesto e tornar a entregá-lo ao presidente. Nós temos um excelente parque industrial, vendemos aviões, assim precisamos de uma juventude que possa usufruir e obter bons empregos e isso só será possível com estrutura educacional bem feita.
Como isso pode ser feito?
Nós queremos uma política de estado, não é porque hoje sou presidente e amanhã é a senhora, que o meu trabalho vai ser jogado fora, que é o que tem acontecido. Repito: no sentido de educação e cultura tem que haver uma política de estado com uma projeção mínima de 20 anos, e daqui esse tempo se faz uma nova porque o mundo será outro, mas no momento esta é a política na qual nós acreditamos e a responsabilidade é do governo em todas as suas esferas.
 Voltando ao tema da dificuldade em se vender livros no Brasil, o senhor acha que a disponibilização de livros na internet atrapalha ainda mais as vendas?
A internet não atrapalha. A tecnologia é muito bem-vinda para transmitir notícias com rapidez, nós somos defensores dela, mas não há substituição para este produto que se chama livro. Só o cheiro dele, do papel, já é uma alegria. Se me dessem esse “aparelhinho” para leitura (o e-book) eu não iria querer.
Já se percebe a atuação da tecnologia e algum resultado para o mercado editorial?
Ainda são poucas as editoras que disponibilizam conteúdo na internet. Sei apenas de duas — Senac e Calis — que firmaram contrato com o site de busca Google, e outro dia eu li que essas editoras se sentiam satisfeitas. A maior parte dos editores tem receito que o terreno seja escorregadio, pois levar um tombo e se reerguer é difícil. Até mesmo as editoras que pertencem a universidades — temos cerca de 120 — não chegaram a uma conclusão e ainda se resguardam.
 No caso da internet a maior preocupação é com o direito autoral?
É esse o grande problema, o respeito ao autor da obra, que é sagrado, pelo menos no regime em que vivemos. Um autor para escrever um livro seja qual for o gênero, leva um ano, até cinco anos. Alguns autores passaram grande parte da vida para fazer um livro. Essas empresas de internet têm um envolvimento muito grande no mundo dos negócios e, lamentavelmente, em grande parte dos países do mundo, a atividade do escritor é sacrificada.
Alguma vantagem da internet?
A internet é boa para as bibliotecas, que tornam mais fácil o acesso de conteúdo ao público em geral. Até aí tudo bem. É bom que autores como Saramago fez recentemente, entreguem seu acervo para grandes bibliotecas, assim as grandes massas poderão ter contato com a leitura.
 Qual a receptividade do livro brasileiro no exterior?
É boa. Jorge Amado e Paulo Coelho são traduzidos para várias línguas. Ziraldotambém faz sucesso, assim como Maurício de Souza. As grandes feiras como a de Frankfurt, Guadalajara, Espanha e Estados Unidos são bons canais de intercâmbio. A participação brasileira infelizmente é pequena, porque participar dessas feiras é muito custoso e nós temos tido apoio restrito por parte do governo. Só para estarmos na maior feira de livros do mundo, em Frankfurt, que contou com 41 editoras brasileiras, foram gastos R$ 250 mil. Na Espanha, por exemplo, onde participamos recentemente do Congresso de Editores Ibero-americanos, ficamos surpresos com a qualidade do evento, que tem entre 70% e 80% de patrocínio do governo espanhol.

Fonte: unisinos.com.br

Cura de memórias dolorosas da Reforma


O presidente da Conferência Menonita Mundial, pastor Danisa Ndlovu, do Zimbábue, disse que o pedido de perdão dos luteranos expressa “profundo sentimento de dor e pesar” pelas perseguições perpetradas contra anabatistas, no século XVI.
A notícia é da Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação (ALC), 24-07-2010.
O pedido de perdão ocorreu durante culto de arrependimento, realizado na quinta-feira, 22, na programação da 11ª Assembléia da Federação Luterana Mundial (FLM), reunida em Stuttgart, Alemanha, de 20 a 27 de julho.
“Chegamos a um ponto em que nos perdoamos mutuamente”, disse Danisa, em coletiva de imprensa, após o pedido de perdão dos luteranos.
Segundo a líder menonita, “todos nós temos atitudes e percepções equivocadas uns a respeito dos outros”. No caso da comunidade anabatista, a autopercepção “como vítimas leva a olhar o outro de uma perspectiva equivocada”, assinalou.
No século XVI, adeptos da Reforma perseguiram os anabatistas – os rebatizados – tinham concepções mais radicais que os reformadores protestantes, especialmente no que diz respeito à separação de Igreja e Estado, da não-violência e do batismo de crianças.
Eles foram perseguidos, por isso, em várias regiões da Europa. Muitos anabatistas foramortos, presos, exilados. A memória dessas atrocidades, esquecidas durante muito tempo na tradição luterana, foi conservada até hoje e é um componente significativo da identidade menonita e anabatista.
Comissão Internacional de Estudos Luterana-Menonita trabalhou, de 2005 a 2009, sobre essa história, resultando num relatório denominado “A cura das memórias: Reconciliação por meio de Cristo”. O relatório é a primeira narrativa em comum dos fatos que marcaram as relações entre luteranos e anabatistas durante a Reforma do século XVI.
“Não se pode mudar o passado”, apontou o relatório da comissão mista de estudo, “mas podemos mudar a maneira como se recorda o passado no presente. Abrigamos essa esperança. A reconciliação não é somente olhar para trás, ao passado, mas, antes, dirige o olhar a um futuro comum.”
“Para mim, pessoalmente, hoje foi um dia histórico”, disse o tesoureiro da Conferência Menonita Mundial, o paraguaio Ernst Bergen, após a celebração de perdão, em Suttgart.
  Fonte: unisinos.com.br

Oração em concordância, alguém duvida??

indonesia Ora para cá, ora para láFiquei muito pensativo ao ver esta foto.

É uma reunião de oração na Indonésia, são muçulmanos.

Percebam: ninguém indiferente, ou conversando com a pessoa ao lado, ou murmurando, ou rindo, ou incomodado com a hora. Quando teremos esta reverência e zelo na oração conjunta?

Todos em uma unidade impressionante e comovente. Certamente causam impacto em quem entrar nesta mesquita.

Não será por isso que são a religião que mais cresce no mundo? Inclusive na Europa pós-cristã? 

Não passam uma idéia de sincera devoção e transcendência?

Que nossas reuniões de oração também causem o mesmo impacto, nos que as observam.

sábado, 26 de junho de 2010

PARA LEMBRAR: TORTURA NUNCA MAIS

O preço do diálogo e do perdão


O diálogo, uma relação exigente

"O problema do nosso mundo é que é muito mais fácil criar um extremista do que um homem do diálogo, um ideólogo do que um espírito crítico. Dito isso, só os homens de diálogo são homens de paz e, como não se pode viver eternamente em conflito, são eles que têm as chaves do futuro."

A opinião é de Antoine Nouis (foto), pastor da Igreja Reformada Francesa, em artigo publicado na revistaRéforme, n° 3374, 24-06-2010. A tradução é deMoisés Sbardelotto.

Eis o texto.

O Talmude relata que dois grandes mestres do judaísmo, rabinos Yohanan e Resh Lakish, tinham o hábito de estudar juntos. Quando o segundo morreu, propuseram ao rabino Yohanan que tivesse o rabinoÉlazar como companheiro de estudos. Nos seus diálogos, este último aprovava tudo o que o rabino Yohanan dizia e levava também novas provas em defesa do que dizia. O rabino Yohanan disse: "Você não é de nenhuma utilidade para mim! Resh Lakish trazia 24 objeções ao que eu afirmava e me obrigada a lhe dar 24 respostas. Então, o nosso ensinamento comum era enriquecido. O estudo com você não me dá nada". Segundo esse apólogo, o objetivo do estudo não é descobrir a verdade, mas ir sempre além na busca dos seus argumentos.

Encontramos duas grandes tradições intelectuais que são fundadas no diálogo: a maiêutica socrática e a controvérsia rabínica.

A ética do diálogo

Para Sócrates, o objetivo do diálogo é se libertar de todos os raciocínios errados para chegar a um pensamento rigoroso. Um dos seus descendentes, Aristóteles, estabeleceu as regras da lógica que permitem qualificar a qualidade de um raciocínio. Encontramos um fruto desse método na Suma Teológica de Tomás de Aquino, que não expressa uma proposição sem citar e responder a todas as objeções que lhe podem ser opostas. Pode-se ver nisso a pretensão de uma verdade fechada e definitiva, mas pode-se ver também a probidade intelectual de um homem que leva em consideração todas as refutações do seu pensamento.

No pensamento rabínico, a arte da disputa traz o nome de mahloquèt (discussão), palavra que evoca a abertura e o caráter sempre plural das interpretações. O objetivo não é descobrir a verdade, uma vez que serão eliminados todos os erros de raciocínio, mas não fazer uma afirmação sem colocá-la em confronto com outras interpretações. Como forma, o Talmude se apresenta como um discurso irredutivelmente plural, comentários de comentários, turbinas de perguntas, a maior parte das quais continua sem uma resposta unívoca. O princípio de base é que, se Deus é palavra, e já que por essência Deus é infinito, a palavra também o é. O objetivo da disputa não é chegar a uma afirmação pura, mas a uma afirmação aberta, não idolátrica.

Uma vez postas as bases, podemos apresentar a ética do diálogo em torno a três princípios. Etimologicamente, a palavra diálogo evoca o modo em que somos atravessados pela palavra do outro (dia-logos). Para dialogar, é preciso estar em dois, mas é preciso também que cada um esteja disposto a se deixar atravessar pela palavra do outro, o que pressupõe que cada um admita que a sua própria posição pode ser superada. Cloranescreve que o "fanatismo é a morte da conversa. O que se pode dizer a alguém que se recusa a procurar compreender as razões do outro e que, a partir do momento em que não se inclina diante das suas, preferiria morrer ao invés de ceder?". Dizendo com outras palavras com Jean-Pierre Vernant: "Não se discute receitas de cozinha com um antropófago!".

Um caminho comum

O requisito indispensável para o diálogo está na convicção de que nós não possuímos a verdade, mas que ela está diante de nós. Como escrevia Charles Péguy: "Uma grande filosofia não é aquela que profere juízos definitivos, que introduz uma verdade definitiva. É aquela que introduz uma inquietação, que abre para uma transformação". Quando, noEvangelho, Cristo diz que ele é o caminho, a verdade e a vida, esse versículo nos lembra que a verdade é um caminho e que se encontra em uma pessoa, Cristo, e não em uma doutrina. Nós nunca possuímos Cristo, estamos sempre em busca para entender melhor o que significa a sua palavra.

O diálogo se distingue do debate no sentido de que o debate é uma competição, um dos protagonistas vence, e o outro perde, e no sentido de que ambos permanecem nas suas próprias posições. No diálogo, pelo contrário, os dois interlocutores evoluem, porque enriqueceram a sua compreensão do assunto. Um livro africano dizia: "Se eu falo com um homem, e ele não entende, me calo e ouço. Esforço-me para entendê-lo, porque, se consigo entendê-lo, saberei porque ele não me entende".

É a ideia segundo a qual o contrário de uma verdade não é um erro, mas uma estupidez. Mas se o oposto de uma afirmação verdadeira é uma afirmação falsa, o oposto de uma verdade profunda pode ser uma outra verdade profunda.

Definido desse modo, o diálogo é exigente e por isso é tão raro. Corresponde a uma verdade hospitalidade no campo do pensamento. Assim como na hospitalidade, a palavra hóspede significa tanto aquele que recebe, quanto aquele que é recebido, para indicar que ambos, quem acolhe e quem é acolhido, se enriquecem reciprocamente, um verdadeiro diálogo é sempre um caminho comum que desemboca em uma nova compreensão da própria verdade. 

O preço do diálogo

Dan Bar-On, psicólogo israelense que trabalhou pela reconciliação entre os povos na fronteira de Gaza, conta que permitiu um encontro entre um judeu e um palestino que haviam, ambos, perdido um filho durante a guerra. Conseguiram dialogar, mas o resultado daquele encontro foi que ambos se viram marginalizados nas suas respectivas comunidades, tratados como párias no meio dos seus.

Mais dramaticamente, Anouar el-Sadat e Yitzhak Rabbin, que foram homens de paz, que assumiram o risco de dialogar com o adversário, foram ambos assassinados pelos extremistas do seu próprio campo. O problema do nosso mundo é que é muito mais fácil criar um extremista do que um homem do diálogo, um ideólogo do que um espírito crítico. Dito isso, só os homens de diálogo são homens de paz e, como não se pode viver eternamente em conflito, são eles que têm as chaves do futuro.

Jonathan Sacks, grande rabino de Londres, escrevia que, pela memória do passado, devia se lembrar das atrocidades cometidas pelos seus inimigos, mas que, para construir o futuro, o diálogo se impunha como um imperativo moral: "Pelo amor dos meus filhos e dos filhos dos meus filhos que ainda não nasceram, não poderei construir o seu futuro sobre os ódios do passado, nem ensinar-lhes que amem mais a Deus amando menos as pessoas".

Fonte unisinos.com.br

A fé como uma aposta

Falar de Deus aos que não creem

Thomas é um jovem cientista agnóstico que teve a boa ideia de querer se casar com uma filha de pastor. Então, o sogro, depois de algumas discussões que se imaginam como intensas, escreveu uma carta ao futuro genro para "explicar-lhe a fé cristã". Pode-se ler esse pequeno livro ("Lettre à mon gendre agnostique pour lui expliquer la foi chrétienne" [Carta a meu genro agnóstico para explicar-lhe a fé cristã], Ed. Labor et Fides, 2010, 102 páginas) em menos de duas horas, e a forma epistolar torna sua abordagem simpática.

A reportagem é de Marie Lefebvre-Billiez, publicada na revista Réforme, n° 3374, 24-06-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Antoine Nouis começa com um enigma: como é que o cristianismo pôde se difundir tanto assim, já que o seu fundador, Jesus Cristo, morreu jovem, abandonado por todos os seus? Não é necessário levar a sério o testemunho dos seus discípulos que afirmam tê-lo visto novamente vivo depois da morte? Sobre essa base, o pastor reformado propõe uma reflexão em dois tempos: aquilo que a Bíblia diz sobre o homem, com uma análise do relato da Criação e os seus dois personagens emblemáticos, Adão e Eva. E depois aquilo que a Bíblia diz de Deus, aquele absoluto que se "restringiu", para que o homem exista livremente. Por fim, Antoine Nouis propõe a fé como "uma aposta e uma luta". Por isso, lança o desafio de tentar: "O que você arrisca?".

Não encontramos no livro palavras incompreensíveis de teologia, nem afirmações dogmáticas peremptórias. Mas muitas referências aos filósofos e aos teólogos judeus, que põem esse livro em um nível bastante intelectual. Para Guy Belestier, secretário nacional encarregado da coordenação inter-regional para a evangelização da Igreja Reformada francesa, esse livro é "muito denso, rico de coisas sobre as quais se pode refletir e discutir, com narrações interessantes", como por exemplo "as pulgas na orelha do elefante".

Porém, a obra não deve ser separada do seu contexto: "Ela se dirige a uma pessoa já em contato com a religião por meio da futura mulher e do sogro. É a consequência de um diálogo. Dirige-se, portanto, a pessoas que têm o desejo de ir além, de entender e de pôr questões. Não é para não crentes que põem um outro tipo de questões, como 'Por que o mal?'. Não se fala disso".

Segundo Guy Balestier, propôr a fé como uma aposta, exortando a experimentá-la, é uma coisa muito moderna e pertinente para um cientista. Isso põe a problemática em uma dinâmica triangular: compreender, crer, praticar. "Há muitos caminhos diferentes que levam à fé. A frase, bastante evangélica, de 'belonging before believing' (pertencer antes de crer) é um dos tantos possíveis. A pessoa é levada ao caminho da vivência religiosa por uma comunidade que a leva. 'Viva as coisas e você vai ver!'". Entretanto, Guy Balestier adverte: uma pessoa que enfrente esse tipo de percurso terá a necessidade de ser acompanhada, além do livro.

Liberdade revolucionária

É justamente o caso de Estelle, 29 anos, que se define como "uma ateia que se coloca perguntas". Crescida sem nenhuma educação religiosa, não batizada, começou a se questionar no ano passado. Sentia uma "falta de espiritualidade" e fez um retiro de silêncio que lhe permitiu "descer profundamente em mim mesma".

O livro de Antoine Nouis permitiu-lhe aprofundar as suas interrogações. "Principalmente, é estranho viver sem se colocar o problema de saber se há uma outra dimensão além da de trabalhar para ganhar dinheiro e gastá-lo. E, depois, por que existe tantas pessoas na Terra que acreditam? Os ateus são uma minoria! Por muito tempo, pensei que os crentes fossem estúpidos que tinham medo da morte. Com esse livro, me dei conta de que as pessoas não acreditam porque têm medo. É uma coisa muito mais complexa e profunda".

Estelle achou muito interessante o ponto em que se fala da liberdade. "Nós somos livres para fazer erros e de dar as costas para Deus. Por isso, existem pessoas ateis como eu. Isso é revolucionário!". Então, Estelle quis aceitar o desafio. Marcou um encontro com o padre da paróquia mais próxima. Mas ao mesmo tempo "tive medo de subverter os meus costumes, de não ser mais eu mesma, de perder os meus amigos. Não desejo arrastar os outros comigo". Ela pensa no seu companheiro, com o qual vive sem ser casada e do qual está grávida. O bebê, "decidimos não batizá-lo". Porém, ela deseja fortemente "continuar o meu próprio caminho, ir além. Tenho vontade de acreditar. Estou a caminho". Desejamos-lhe uma boa viagem.

Fonte:
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=33761

Quem conhece a Deus não tortura

Hoje, 26 de junho, comemora-se o "Dia Internacional em Apoio às Vítimas da Tortura", estabelecido pela ONU.

É importante perceber que, a observação da Lei do Amor, proposta por Jesus, tornaria este dia universal e diário por um lado, ou absolutamente desnecessário, por outro lado, na intensidade do reino de Deus praticado. Na regra de ouro, ensinada por Ele, aprendemos que não devemos fazer aos outros o que não desejamos que estes façam a nós. Resumo básico da "Lei e dos Profetas".

A correta interpretação das palavras de Jesus, absorve muitos mandamentos tipo: "Não torturarás". Quem ama não precisa de leis ou ordenanças, como na definição de Santo Agostinho: "Ama e faze o que quiseres".

Quem ama conhece a Deus, na definição dele mesmo.

Luciano Oliveira

O Haiti é aqui

A comparação da situação de diversos municípios de Alagoas com o país centro-americano foi feita por Wellington Santos, pastor da Igreja Batista do Pinheiro, em Maceió (AL). Desde a sexta-feira, 18, cidades dos Estados de Alagoas e de Pernambuco vivem uma tragédia, com o ambiente transformado num cenário de guerra e um rastro de destruição, causados pelas últimas chuvas.Mesmo que os números ainda não sejam precisos, ficam os relatos da tragédia que levou dezenas de vidas, deixando cidades como Santana do Mundaú e Branquinha totalmente arrasadas e destruídas pelas correntezas. O mesmo aconteceu em Lourenço de Albuquerque, em Rio Largo, Utinga e Murici. “Quanta dor, destruição, tristeza e imensa necessidade!”, lamenta o religioso.
Santos tem claro, porém, de que “o cenário de miséria e pobreza com que nos deparamos não é fruto desta tragédia natural da última sexta-feira, mas resultado de anos de corrupção, desvio de verbas públicas, coronelismo, preguiça e irresponsabilidade eleitoral por parte do povo que escolhe muito mal seus representantes”.
Sem admitir que a culpa fique com a chuva ou a natureza, insiste na crítica aos “maus gestores públicos e, porque não dizer, livrando nossa parcela de culpa, quando fazemos negociatas e ou trocamos nosso precioso voto por ‘favores’ vergonhosos”.
Reginaldo Silva, pastor batista que atua na Organização Não-Governamental (ONG) alemã Kindernothilfe, nesta região do país, manifestou solidariedade aos alagoanos e protestou diante do fato de terem sido vítimas “da tragédia causada, não pelas chuvas, mas pela falta de políticas sociais que não resolve os problemas das ocupações desordenadas, da falta de moradia, de educação ambiental etc. Se observarmos bem, veremos que é a falta destas e de outras coisas que causam tragédias como a mais recente”.
Santos lembrou a música O Haiti é aqui, do compositor Gilberto Gil, destacando os indicadores econômicos do Estado de Alagoas: “42% de analfabetos, 92% da população ganhando até 2 salários mínimos, concentração de renda e de terra, monocultura da cana de açúcar que enriquece uma minoria e empobrece a grande maioria, violência galopante, índices sociais críticos e agora, some-se a tudo isto, 50 mil desabrigados e cidades inteiras destruídas”.
Ele pediu que a população participe na campanha para conseguir colchões, lençóis, toalhas, agasalhos, água potável, cestas básicas, móveis usados, entre bens não perecíveis.
ALC/Notícias Cristãs




SOU ÉTICO! Cito as fontes. Copiado do Site Notícias Cristãs. Link Original: http://news.noticiascristas.com/2010/06/o-haiti-e-aqui-denuncia-pastor-batista.html?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed%3A+NoticiasCristas+%28NOT%C3%8DCIAS+CRIST%C3%83S%29#ixzz0rxrvCF4o
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terça-feira, 22 de junho de 2010

O modo de vida cristão que fala

Em meio a Babel
Por Paulo Brabo

Estocado em Goiabas Roubadas

Na igreja ocidental contemporânea o discurso sobre missões é com frequência dominado pelo desenvolvimento de estratégias. A igreja, impelida por um pragmatismo que é, ele mesmo, definitivo da cultura ocidental, vive buscando aquela estratégia que irá ocasionar a conversão das massas. Se a estratégia certa, se as palavras certas forem encontradas, o reavivamento irá ocorrer. A igreja deve proclamar a mensagem em sua forma original, deixando que seu modo de vida interprete a mensagem.Segundo esse modo de pensar, a boa nova deve ser traduzida para a linguagem da cultura para que se torne acessível, a fim de que as fileiras de uma igreja moribunda sejam engrossadas.


Este artigo procurará demonstrar que estratégias missionais que apresentam o evangelho numa linguagem compreensível para a cultura ocidental estão fadadas ao fracasso. Quando a igreja usa a linguagem da cultura ocidental para proclamar a boa nova, as definições culturais sequestram o significado cristão, sendo que o único resultado possível é um cristianismo cultural. Além disso, a própria noção de linguagem tem perdido significativamente o seu valor na sociedade contemporânea; as tentativas cristãs de pronunciar-se culturalmente representam mera capitulação às estruturas de Babel e sua participação nelas. Portanto, se a igreja ocidental deseja tornar-se missionária, deve aprender a pronunciar-se cristãmente em meio a Babel. Em vez de alterar a mensagem do evangelho, a igreja deve proclamar a mensagem em sua forma original, deixando que seu modo de vida interprete a mensagem.


A mensagem cristã não deve e não pode ser empregada simplesmente a fim de prover aprovação cultural para o modo de vida cristão. Ao contrário, é o modo de vida cristão, aliado à fé no Espírito Santo, que deve prover conteúdo e significado à mensagem cristã. Quando o cristianismo for proclamado dessa forma a igreja estará equipada para revelar um modo de vida novo e radical à cultura ocidental dominada pelos ídolos do capitalismo de livre-mercado e da democracia liberal.



Daniel Oudshoorn

Poser or Prophet

Fonte: baciadasalmas.com

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Ricardo Gondim transformando palavras em sementes

Visitas ao inferno.


Ricardo Gondim


Já visitei o inferno. Estive lá em vida. Já entrei em suas câmaras horrendas diversas vezes. Em todas, padeci muito. Nada sei sobre o "Hades" mencionado pelos religiosos. Aquele que jaz embaixo da terra e começa depois da morte não me interessa. O inferno que já conheci e que me machuca fica aqui mesmo, na terra dos viventes.

Já estive no inferno do engano. Há algum tempo, visitei um parque suíço, em Zurique, para onde convergiam os toxicômanos da cidade. Subi o viaduto que atravessa o parque e do alto contemplei um cenário surreal e dantesco. Lama, lixo e fezes, atolavam rapazes e moças naquele submundo. Ali não existiam humanos, apenas carcaças ambulantes. Naquela mesma noite, no avião, desejei dormir profundamente só para fugir do que testemunhara. Eu preferia qualquer pesadelo a ter que conviver com aquele cenário, tão real. Perguntei-me diversas vezes quem eram aqueles jovens. E porque se revoltavam contra o sistema. Se tentavam ser livres, criaram uma masmorra. Acabaram construindo o inferno com as próprias mãos.

Daquele dia, despertei: o Lago de Enxofre permeia o mundo em que existo. Cada um daqueles jovens tinha um pai. Um pai que pranteia porque não sabe como apagar as labaredas medonhas do lago de enxofre.

Já estive no inferno da culpa. Hoje sei que nenhum tormento provoca maior dor que a culpa. Qualquer mulher culpada sabe o tamanho de sua opressão. Qualquer homem culpado fala que os ossos derretem com uma consciência pesada. Culpa é ácido. A culpa avisa que o passado não pode ser revisitado. Assim as pessoas se submetem a carrascos internos e esperam redenção através de açoites. A dor da culpa lateja como um nervo exposto.

Os culpados procuram dissimular o sofrimento com ativismos, divertimentos e até promiscuidade. Mas a culpa não cede; persegue, persegue, até aniquilar iniciativa, criatividade e esperança. Recordo quando, no final de uma reunião, uma mulher me procurou pedindo ajuda. Seu marido se suicidara de forma violenta. Depois de enroscar uma tira de couro no pescoço, deu partida em um motor, que não só o estrangulou como lhe decepou a cabeça. Mas antes, ele procurou vingar-se. Deixou uma nota responsabilizando a mulher pelo gesto trágico. Diante da tragédia, aquela pobre mulher, desorientada e aflita, não sabia como sair do cárcere que o marido meticulosamente construíra.

Já estive no inferno da maldade. Conheci homens nefastos. Sentei-me na roda de ímpios. Frequentei sessões onde o martelo inclemente da religião espicaçou inocentes. Vi sacerdotes alçando o vôo dos abutres. Semelhante às tragédias shakespeareanas, eu próprio senti o punhal da traição rasgar as minhas vísceras. Fui golpeado por suspeitas e boatos. Com o nome jogado em pocilgas, minha vida foi chafurdada como lavagem de porco. Senti o ardor do inferno quando tomei conhecimento da trama que visava implodir o trabalho que consumiu meus melhores anos. E eu não sabia como reagir.

Portanto, quando me perguntam se acredito no inferno, respondo que não, não acredito. Eu o conheço! Sei que existe. Eu o vejo ao meu redor. Inferno é a sorte de crianças que vivem nos lixões brasileiros. Inferno é o corredor do hospital público na periferia do Rio de Janeiro. Inferno é o campo de exilados em Darfur. Inferno é a vida de meninas que os pais venderam para a prostituição. Inferno é o asilo nos Estados Unidos, que não passa de um depósito onde os velhos esperam a morte.

Um dia, aceitei a vocação de lutar contra esses infernos que me rodeiam, assustam e afrontam. Ensinei e continuo a ensinar que Deus interpela homens e mulheres para que lutem contra suas labaredas. E passados tantos anos, a minha resposta continua a mesma: “Eis-me aqui, envia-me a mim”.

Acordo todos os dias pensando em acabar com os infernos. Gasto a minha vida para devolver esperança aos culpados; oferecer o ombro aos que tentam se reconstruir; usar o dom da oratória para que os discriminados se considerem dignos. Luto para transformar a minha escrita em semente que germina bondade em pessoas gripadas de ódio. Dedico-me ao estudo porque quero invocar o testemunho da história e mostrar aos mansos que só eles herdarão a terra onde paz e justiça se beijarão.

Soli Deo Gloria

18-06-10

Fonte: ricardogondim.com.br

Ateísmo ético

Saramago por Leonardo Boff


Saramago se considerava ateu, mas de um ateísmo muito particular. Entendia o "fator Deus" como veiculado pelas religiões e pelas Igrejas como forma de alienação das pessoas. Seu ateísmo era ético, negava aquele "Deus" que não produzia vida e não anunciava a libertação dos oprimidos.

Essa compreensão pude discuti-la pessoalmente num encontro em 2001, na Suécia. Ele viera a Estocolmo para um encontro de todos os portadores do Nobel. Eu lá estava, pois fora indicado para o prêmio The Right Livelihood Award. Convidou a mim e à minha companheira Márcia para um jantar. Foi um festim de espiritualidade mais do que de literatura. Levei-lhe um livro de contos indígenas, O Casamento do Céu com a Terra, e para a sua esposa Pilar um outro, Espiritualidade: Caminho de Realização. Ele logo foi dizendo: "quero o livro de espiritualidade, pois pretendo me aprofundar neste tema".

Falamos longamente sobre religião, Deus e espiritualidade. Negava a religião, mas não a espiritualidade como sentimento do mistério do mundo, da profundidade humana e do amor aos oprimidos. Mostrou sua admiração pela Teologia da Libertação por fazer do "fator Deus" uma força de superação da miséria humana. Fomos madrugada adentro, já em seu quarto de hotel, como se fôssemos velhos amigos.

O e-mail a seguir revela a experiência espiritual que juntos vivenciamos:

"Querido Leonardo, querida Márcia: para nós, o grande acontecimento em Estocolmo foi ter-vos conhecido. Não exageramos. (...) O tempo que estivemos juntos foi um banho para o espírito. Quem dera que em breve surja outra ocasião. Os anos são todos terríveis para aqueles para quem a vida é terrível. Às vezes as coisas correm melhor no mundo e isso leva-nos a pensar que estamos em paz, mas o mesmo não poderiam dizer os milhões de seres humanos cujas opiniões contam tão pouco que praticamente não se dá por elas. E se de alguma maneira chegam a manifestar-se, os modos de as silenciar, não faltam. O vosso trabalho cria e reforça consciências livres ou em processo de libertação. (...)".

Ganhamos um amigo e a fé me diz que ele agora mergulhou naquele Mistério de amor que sempre buscou.

LEONARDO BOFF É TEÓLOGO E ESCRITOR

Fonte: reinoutopico.blogspot.com

O tempo voa

Sérgio Pavarini


“Quem sabe o que é bom para o homem, nos poucos dias de sua vida vazia, em que ele passa como uma sombra?”

Eclesiastes 6.12 – NVI

O poeta romano Virgílio usou pela primeira vez nas Geórgicas a expressão tempus fugit, que significa “o tempo foge”. A Bíblia também contém várias metáforas que tentam descrever e enfatizar a brevidade de nossa existência. Mesmo assim, muitas vezes o timão do nosso barco não está nas mãos divinas e os ventos das circunstâncias nos deixam ao sabor das ondas bravias.

Imagine o total de horas que você vai passar neste planeta. Se você calcular o tempo dedicado a várias atividades, descobrirá que talvez gastará um tempo maior no trabalho do que com a própria família. É um dado que não pode ser desprezado, afinal não teremos nova chance de começar tudo outra vez e vivermos de forma mais consciente.

Se você já trabalhou em outra empresa, consegue avaliar qual foi a sua herança do tempo que esteve lá? Freqüentemente, não conseguimos sequer manter a amizade com pessoas que passaram o dia todo ao nosso lado durante muito tempo. Se os relacionamentos são superficiais, as habilidades profissionais que obtivemos por vezes são ainda menos palpáveis. Às vezes só nos damos conta disso quando estamos desempregados.

Quem trabalha em uma livraria vive em meio a um manancial de conhecimento em diversas áreas. Mesmo assim, há quem morra de fome dentro do supermercado. Os livros estão ao alcance das mãos, mas a alma nunca é alimentada. Como apregoava uma antiga campanha que preparei, “quem lê sabe mais”. E não só isso: conquista melhores empregos, obtém notas melhores no vestibular, se expressa com mais facilidade e sempre terá chances maiores de destaque em quaisquer áreas.

Há grandes redes de livrarias que não apenas estimulam, mas estabelecem metas de leitura para seus funcionários. Quem não conhece o que comercializa e não sabe fazer indicações corretas para os consumidores, é dispensado. Do ponto de vista profissional, esse tipo de demissão é menos nocivo do que permitir que alguém passe anos em uma empresa sem aprimorar suas habilidades.

O futuro que você não ousou sonhar pode estar ao alcance de suas mãos nas estantes ou nas gôndolas do lugar em que trabalha. “Sempre imaginei o paraíso como uma grande biblioteca”, disse o escritor argentino Jorge Luis Borges. Esqueça as desculpas e comece hoje mesmo a buscar inspiração para compor as próximas páginas de sua história. “Há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu.” Creia nisso.
 
Fonte: PAVABLOG

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Você é odre novo


Vinho novo, odres novos

Ed René Kivitz
Não sem motivo, a crítica às igrejas chamadas tradicionais cresce a cada dia. Por igrejas tradicionais me refiro àquelas vítimas do tradicionalismo (aqui sempre fizemos as coisas desse jeito!), legalismo (aqui as boas doutrinas e o bom comportamento valem mais do que as boas pessoas, até porque, exceto nós, não existem boas pessoas!) e do formalismo (silêncio, você está na casa do Senhor!).
A resposta que se dá a esse cenário é múltipla. Há os que abandonam a vida comunitária e passam a caminhar sozinhos, de roda em roda e de bar em bar, chamando de igreja qualquer reunião de chopp entre dois ou três cristãos, ou tentando cultivar a piedade na virtualidade por meio de mp3, podcasts, cultos online e afins. Há também os que escolhem formar grupos informais, que se reúnem regularmente, por exemplo, no cyber-espaço, nas lanchonetes, pátios de universidades, auditórios alugados para fins de semana e, principalmente, nas casas dos cristãos, que funcionam como mini-auditórios para enc ontros informais ao redor da mesa.
A maioria dessas pessoas, ou teve uma experiência negativa com as igrejas chamadas tradicionais ou dela foram banidas contra a sua vontade e, por esta razão, buscaram novos jeitos de ser igreja. Poucas fizeram uma opção deliberada de rompimento justificado pela busca de uma espiritualidade mais autêntica e mais profunda.
O fato é que, independentemente das razões pelas quais se reúnem fora dos horizontes institucionais tradicionais, há algo que precisa ser sublinhado: a maioria dessas pessoas é vítima de uma mentalidade religiosa nociva e obsoleta. Do lado de fora das igrejas tradicionais existe um contingente imenso de pessoas que, com a mesma intensidade com que busca a Deus, rejeita a incoerência, a hipocrisia e os desmandos das estruturas de poder eclesiástico.
Por outro lado, há também uma característica comum a esses grupos informais: a maioria acredita que o fato de estarem fora das igrejas chamadas tradicionais implica a natural participação e experiência do que Jesus chamou de “odres novos”. Não devemos confundir odres novos com novas formas de igreja. O odre novo capaz de conter o vinho novo do evangelho é a nova mentalidade, gerada pela experiência da graça de Deus, e não uma nova instituição ou nova forma de organização de pessoas.
Qualquer forma e sistema que se pretenda oferecer para conter o vinho novo do Evangelho da graça será um odre velho, pois o vinho novo está derramado sobre todos os que foram feitos livres pelo sopro do Espírito de Deus, que sopra onde quer. O vinho novo, portanto, está presente em, e por meio de, todos os que nasceram da água e do Espírito, e se manifesta em todo lugar, todo tempo, por meio de tudo o que fazem, qualquer que seja a instituição, estrutura eclesiástica ou forma organizacional em que estejam.
Ouço muita gente dizer que os “odres novos” são equivalentes a estruturas organizacionais mais leves, ágeis, flexíveis, não engessadas e assim por diante. Mas a questão é que qualquer estrutura é odre velho, pois o Evangelho não visa a gerar novas instituições, mas pessoas novas. O “odre novo”, meu irmão, minha irmã, é você, sua cabeça e seu coração. O que passa disso é ilusão e destruição, pois, de fato, “ninguém põe vinho novo em odre velho; se o fizer, o odre rebentará, o vinho se derramará e odre se estragará. Ao contrário, põe-se vinho novo em odre novo; e ambos se conservam”.

Jeremias explicou o seu tempo e o nosso

Palavras do profeta Jeremias:

"Os líderes do povo são insensatos e não consultam ao Senhor; por isso não prosperam e todo o seu rebanho está disperso." (Jr 10,21 NVI)







segunda-feira, 7 de junho de 2010

A oração como uma identidade do cristão

No evangelho de Lucas, capítulo 11, temos a descrição de um importante momento na relação de Jesus com os seus discípulos. Jesus estava orando "em certo lugar" e seus discípulos, provavelmente, estavam próximos o suficiente para perceber sua atividade. Ao terminar o seu momento devocional, ele é imediatamente abordado por um dos seus observadores, que lhe faz um pedido bem específico; "Senhor, ensina-nos a orar" (v.1).

Ele toma a frente do grupo e pede algo que ele acha ser importante para todos. Eles conviviam com Jesus diariamente, viam seu poder manifestado, as maravilhas acontecendo no meio das multidões que o seguiam, a maneira como os poderes do mal eram confrontados com autoridade e discrição, como as doenças eram expelidas dos corpos com paixão e misericórdia e como os excluídos eram aceitos e amados de forma tão diferente da religiosidade que haviam conhecido no passado.

De alguma forma, sem muita dificuldade, puderam perceber que as orações constantes de Jesus (públicas, secretas, nos montes, às refeições etc.) tinham um elo com as coisas que aconteciam. Ele mesmo já havia agradecido publicamente ao Pai por responder às suas orações dizendo: "Eu sei que sempre me ouves".

No imaginário dos seus seguidores, começava a despontar a idéia de que, se orassem como ele, teriam as respostas de oração que ele vivenciou.

A oração estava ligada a identidade do Mestre. Ele era porque orava, ele orava porque ele era.

No pedido do discípulo também estava a questão da identidade: "Ensina-nos a orar, como também João ensinou aos seus discípulos". Nesta abordagem podemos perceber que os discípulos de João foram doutrinados nesta questão; quem os conheceu percebia um modelo de oração específico que os identificava como discípulos do profeta do arrependimento. Os conteúdos dos seus pedidos estavam carregados da maneira de pensar, de agir, dos sonhos, das utopias, das revelação específicas do seu líder. Agora os discípulos de Jesus queriam que suas orações tivessem a identidade de seu movimento e de seus sonhos e expectativas pessoais. Querem orar como Jesus orou, manifestando em suas petições, as marcas do reino no qual creram e estavam dedicando as suas vidas.

Jesus prontamente atende ao pedido do seu discípulo, colocando para todos eles, e para nós, os conteúdos  da verdadeira oração que, sem dúvida, é a marca do reino de Deus, que foi aproximado de nós, a partir dele. É a oração para nós, é o "Pai Nosso".

No passado, os grupos religiosos podiam ser reconhecidos por meio de suas práticas devocionais. A maneira como oravam os identificava como fariseus, saduceus, discípulos de João, essênios etc. Podemos ser identificados hoje pela maneira como oramos? As pessoas podem observar nossas vidas e identificar influências positivas, como verdadeiros frutos produzidos em favor dos outros?  Temos esta identidade espiritual?

Podemos ser identificados pelos resultados produzidos na sociedade, a partir dos momentos em que celebramos a Deus, de forma pessoal ou em grupo, de tal maneira que percebam os elos que criamos com o sagrado? E ao efetuarem estas associações, as pessoas nos abordam para que as ensinemos como podemos ter as mesmas experiências?

Jesus caminhou com seus discípulos, manifestou a sua identidade e a do Pai, podendo dizer "Eu e o Pai somos um". Nele aconteceu a revelação mais explícita de Deus. O transcendente ficou transparente. Fazia parte de sua natureza o convívio com aquele com o enviou, por meio da oração.

Sua vontade é que o imitemos, segui-lo é seu projeto para todos, e, ao fazê-lo, seu Espírito vem habitar e orar em nós, e quem tiver olhos para ver perceberá e pedirá "ensina-nos a orar".


Luciano Oliveira

Kari Jobe - You Are For Me (Pink Impact Conference 2010) Legendado Portu...

domingo, 30 de maio de 2010

Mudar para acolher verdades



Ricardo Gondim

Os sistemas estáticos são mortos; as ideias engessadas são dogmas intolerantes; as instituições inflexíveis são tiranias. A vida acontece na transformação. Tudo flui. O tempo sangra como hemorragia porque vaza a existência por um ralo cruel. Mas não há como estancar o escoamento das horas.
Mudar é aceitar a inexorabilidade do tempo; é reconhecer a impossibilidade de lançar ganchos, estacionar, e recusar o imperativo divino: “Manda que o povo marche”.
Maquiavel afirmou:
“Não há empresa (tarefa) mais difícil de conduzir, mais incerta quanto ao êxito e mais perigosa, do que a de introduzir novas instituições. Aquele que nisso se empenha tem por inimigos todos quantos lucravam com as instituições antigas, e só encontra tíbios defensores naqueles aos quais as novas se aproveitam”.
Vem de José Comblin a expressão”teologia cínica”. Teologia cínica é a que sistematiza verdades sem criticá-las ou que repete conceitos cristalizados pelo senso comum. Para Comblin, o sentido de “cínico” está conectado ao foco do pensar: quando a defesa do argumento ou do conceito é priorizada sem sensibilidade aos indivíduos.
Falar em tese, pensar a partir de absolutos, reduz a linguagem religiosa ao teorismo da torre de marfim. Acontece que a experiência de Deus na história é de inquietação e não de apatia. A verdade, se pretende ser verdade, deve ligar-se à vida e não ao argumento que satisfaz uma lógica interna.
Hannah Arendt acertou ao afirmar que milagre é a interrupção de qualquer processo automatizado. Mudar é alterar o que outrora se considerava inamovível; é reverter o irreversível. Profetas não encalacram futuro dentro de suas previsões, mas o libertam para infinitas possibilidades. O futuro se bifurca em trilhões de esquinas a partir das decisões livres de homens e mulheres. Os profetas apenas alinhavam o porvir para depois ensinar os pontos que firmariam as costuras.
Mudanças comportamentais são estimuladas entre religiosos, mas mudanças conceituais são vistas como anátemas. Jesus, logo depois de ter dito aos discípulos que era a Verdade (Jo 14.6), prometeu que o outro Consolador, o Espírito Santo, os conduziria a mais Verdade.
Jesus tinha muitas coisas para ensinar, mas os seus seguidores mais próximos ainda não estavam prontos para suportar: “Ele vos guiará a toda Verdade” (Jo 16.13). Eles deveriam manter o coração ensinável, a mente flexível e o coração sensível porque o caminho para a Verdade não se exaurira e nem se esgotaria tão cedo.
Mudar, portanto, significa se abrir para verdades que outrora não encontravam porto na interioridade. Mudar é admitir que nunca estamos totalmente prontos para entender tudo. Mudar é aprender a deixar para trás o que outrora nos encantava para absorver o que os olhos nunca viram, os ouvidos nunca ouviram e nunca o coração humano intuiu. Mudar é abrir mão do que antigamente fazia sentido para que resplandeçam novos lampejos de sabedoria, lucidez e esclarecimento.
Soli Deo Gloria.
fonte: Ricardo Gondim

segunda-feira, 5 de abril de 2010

"O escândalo da pedofilia se constitui num sinal dos tempos atuais’, diz Boff

“O escândalo da pedofilia se constitui num sinal dos tempos atuais. Do Vaticano II (1962-1965) aprendemos que cumpre identificar nos sinais uma interpelação que Deus nos quer transmitir. Vejo que a interpelação vai nesta linha: está na hora de a Igreja romano-católica fazer o que todas as demais Igrejas fizeram: abolir o celibato imposto por lei eclesiástica e liberá-lo para aqueles que veem sentido nele e conseguem vivê-lo com jovialidade e leveza de espírito”. A opinião é do teólogo Leonardo Boff em artigo no jornal O Estado de S.Paulo, 04-04-2010.

Eis o artigo.

O levantamento dos padres pedófilos em quase todos os países da cristandade católica está ainda em curso, revelando a extensão desse crime que tantos prejuízos tem provocado em suas vítimas. É pouco dizer que a pedofilia envergonha a Igreja. É pior. Ela representa uma dívida impagável com aqueles menores que foram abusados sob a capa da credibilidade e da confiança que a função de padre encarna. A tese central do papa Ratzinger que cansei de ouvir em suas conferências e aulas vai por água abaixo.

Para ele, o importante não é que a Igreja seja numerosa. Basta que seja um "pequeno rebanho", constituído de pessoas altamente espiritualizadas. Ela é um pequeno "mundo reconciliado" que representa os outros e toda a humanidade. Ocorre que dentro desse pequeno rebanho há pecadores criminosos e é tudo menos um "mundo reconciliado". Ela tem que humildemente acolher o que dizia a tradição: a Igreja é santa e pecadora e é uma "casta meretriz". Não é suficiente ser Igreja. Ela tem que trilhar, como todos, pelo caminho do bem e integrar as pulsões da sexualidade que já possui 1 bilhão de anos de memória biológica para que seja expressão de enternecimento e de amor e não de obsessão e de violência contra menores.

O escândalo da pedofilia se constitui num sinal dos tempos atuais. Do Vaticano II (1962-1965) aprendemos que cumpre identificar nos sinais uma interpelação que Deus nos quer transmitir. Vejo que a interpelação vai nesta linha: está na hora de a Igreja romano-católica fazer o que todas as demais Igrejas fizeram: abolir o celibato imposto por lei eclesiástica e liberá-lo para aqueles que veem sentido nele e conseguem vivê-lo com jovialidade e leveza de espírito. Mas essa lição não está sendo tirada pelas autoridades romanas. Ao contrário, apesar dos escândalos, reafirmam o celibato com mais vigor.

Sabemos como é insuficiente a educação para a integração da sexualidade no processo de formação dos padres. Ela é feita longe do contato normal com as mulheres, o que produz certa atrofia na construção da identidade. As ciências da psique nos deixaram claro: o homem só amadurece sob o olhar da mulher e a mulher sob o olhar do homem. Homem e mulher são recíprocos e complementares. O sexo genético-celular mostrou que a diferença entre homem e mulher, em termos de cromossomos, se reduz a apenas um cromossomo. A mulher possui dois cromossomos XX e o homem, um cromossomo X e outro Y. Donde se depreende que o sexo-base é o feminino (XX), sendo o masculino (XY) uma diferenciação dele. Não há, pois, um sexo absoluto, mas apenas um dominante. Em cada ser humano, homem e mulher, existe "um segundo sexo". Na integração do animus e da anima, vale dizer, das dimensões de feminino e de masculino presentes em cada um, se gesta a maturidade sexual.

Essa integração vem sendo dificultada pela ausência de uma das partes, a mulher, que é substituída pela imaginação e pelos fantasmas que, se não forem submetidos à disciplina, podem gerar distorções. O que se ensinava nos seminários não é sem sabedoria: quem controla a imaginação, controla a sexualidade. Em grande parte, assim é. Mas a sexualidade possui um vigor vulcânico. Paul Ricoeur, que muito refletiu filosoficamente sobre a teoria psicanalítica de Freud, reconhece que a sexualidade escapa ao controle da razão, das normas morais e das leis. Ela vive entre a lei do dia, em que valem as regras e os comportamentos estatuídos, e a lei da noite, em que funciona a pulsão, a força da vitalidade espontânea. Só um projeto ético e humanístico de vida (o que queremos ser) pode dar direção a essa dialética e transformá-la em força de humanização e de relações fecundas.

Nesse processo o celibato não é excluído. Ele é uma das opções possíveis que eu defendo. Mas o celibato não pode nascer de uma carência de amor, ao contrário: deve resultar de uma superabundância de amor a Deus que transborda para os que estão a sua volta.

Por que a Igreja romano-católica não dá um passo e abole a lei do celibato? Porque é contraditório com a sua estrutura. Ela é uma instituição total, autoritária, patriarcal e altamente hierarquizada. Ela abarca a pessoa do nascimento à morte. O poder conferido ao papa, para uma consciência cidadã mínima, é simplesmente tirânico. O cânon 331 é claro. Trata-se de um poder "ordinário, supremo, pleno, imediato e universal". Se riscarmos a palavra papa e colocarmos Deus, funciona perfeitamente. Por isso se dizia: "O papa é o deus menor na terra". Uma Igreja que coloca o poder em seu centro fecha as portas e as janelas para o amor, a ternura e o sentido da compaixão. O celibatário é funcional para esse tipo de Igreja.

O celibato implica cooptar o sacerdote totalmente a serviço, não da humanidade, mas desse tipo de Igreja. Ele só deverá amar a Igreja. Enquanto essa lógica perdurar, não esperemos que a lei do celibato seja abolida. Ele é muito cômoda para ela.

Mas como fica o sonho de Jesus de uma comunidade fraterna e igualitária? Bem, isso é um outro problema, talvez o principal.

Fonte: unisinos.com.br